Às portas de mais uma edição on line da Feira do Queijo Serra da Estrela de Oliveira do Hospital, os produtores não escondem o impacto “enorme” nas vendas, ditado pela mudança forçada do formato deste certame, devido à pandemia de Covid-19.
O Município oliveirense rapidamente se adaptou e para amenizar as quebras vai avançar novamente com a realização, pelo segundo ano consecutivo, da Feira do Queijo on line. Mas, a realidade é que “nada substitui a venda direta” diz Mariana Vaz Pato, da Queijaria “Os Lobos”, em Oliveira do Hospital.
“Este era o ponto alto de vendas do nosso produto, e o mais importante, mais até que o Natal. Sentimos um impacto tremendo, com esta mudança”, refere.
À frente da sociedade agrícola da família, a economista, lembra que a Feira/ Festa do Queijo Serra da Estrela era o momento mais aguardado por todos: produtores e visitantes. “Nós víamos cada vez pessoas a virem a Oliveira do Hospital, naquele dia, para comprarem queijo, era um local de encontro muito importante para os produtores e ganhou, nos últimos anos uma dimensão nacional e até internacional que a valorizou muito”, recorda a produtora, temendo que o evento, tal como o conhecemos nos últimos anos, não volte a ser possível. “Temos de estar mentalizados para isso e preparar outras iniciativas, mais feiras on line durante o ano, por exemplo”.
Mas há o outro lado da moeda: as vendas no “digital”, ainda “são um problema” para as pequenas produções. Conscientes de que o digital é o presente e não o futuro, Mariana Vaz Pato considera que “as estruturas que nós temos não têm dimensão” para o e-comerce.
“O digital é a sobrevivência, mas é preciso tempo para gerir as redes sociais, as diferentes plataformas, com boas fotos, com boas publicações, com resposta na hora a emails, e isso não é compatível com uma estrutura mínima, como aquela que nós temos. A certa altura, as queijeiras ou produzem um bom queijo ou estão nas redes sociais”, ironiza.
Com a chegada da pandemia, os maiores clientes da queijaria reduziram as suas encomendas e a venda à porta ficou também comprometida, o que leva a produtora a falar na necessidade desse passo ser dado pelas associações representativas dos produtores, como a Ancose e a EstrelaCoop, que, recorda, “já fizeram isso no passado”, mas entretanto deixaram de o fazer porque “houve produtores que venderam abaixo do custo e, boicotaram essa solução”.
Outra dificuldade apontada pela empresária tem a ver com a carga burocrática destas pequenas explorações. “Temos de cumprir exatamente as mesmas regras da indústria, temos de preencher os mesmos formulários, enviar todo o tipo de controlos documentais para as entidades certificadoras, temos de pagar taxas e taxinhas e isto também está a estrangular a actividade”, faz notar, considerando a tutela, neste caso, o Ministério da Agricultura “mais burocrático” e menos “flexível” que o Ministério da Economia, relativamente à indústria.
Com quebras na ordem dos 25% na queijaria “Os Lobos” desde o inicio da pandemia, Mariana Vaz Pato não cedeu, ainda assim, à “tentação” de muitos de baixar preços. “Os produtores como não conseguem chegar ao consumidor final, vêm-se a braços com muito stock e a grande tentação é vender ao desbarato”. Ora , “o queijo Serra da Estrela nunca pode ser um queijo barato, porque tem muita regulação, muito controlo e o leite é mais caro que o leite produzido por outras ovelhas, é um queijo com muita mão de obra”, considera.
Acrescenta que a grande batalha deste setor tem de continuar a ser pela valorização do queijo Serra da Estrela no mercado. “Temos de encarar que o que temos aqui são pedras preciosas que demoraram tempo a lapidar e como tal, têm que ser bem pagas”, afirma a produtora, comparando o trabalho de uma queijeira a uma “pequena cientista” que vai “afinando tudo” para “chegar à combinação ideal para produzir o melhor queijo”. O problema, adianta, é que “esta dedicação e inteligência não são correspondidas em termos salariais” e isto faz desistir “muitos” que têm optado por vender as suas pequenas queijarias a grandes grupos económicos ou simplesmente têm fechado a actividade.
“Se o queijo vai continuar a existir na indústria, obviamente que vai, agora se é o mesmo queijo feito à mão, que se faz nas pequenas queijarias, isso é que eu já ponho as minhas dúvidas, é difícil não haver tentações quando se mistura a produção de queijo certificado, com queijo industrial”, perspetiva Mariana Vaz Pato que destaca, todavia, a resiliência ainda de muitos pastores e queijeiras que, apesar de todas as dificuldades, “não conseguem desistir” de fazer o melhor queijo do mundo e de “levar este produto de excelência à mesa de portugueses e de muitos outros”.
“São receitas que são nossas, são únicas, que falam de nós, que traduzem Portugal”, atenta a economista que sem o maior” banho de otimismo” que era a Feira do Queijo de Oliveira do Hospital, nesta altura do ano, aposta agora na presença na maior feira/festa on line do queijo Serra da Estrela a partir do concelho oliveirense, para animar as vendas da queijaria, em tempo de crise pandémica.