“Sou entusiasta da Jornada Mundial da Juventude de 2023 e da alegria, dinamismo e comunhão de fé que trará a Portugal no próximo ano. Acredito que a Igreja continua a ser uma instituição estruturante para a nossa comunidade, sejamos nós mais ou menos crentes, mais ou menos praticantes.
Em Oliveira do Hospital, os grupos de jovens e a catequese continuam a ser importantes mobilizadores dos cidadãos que estão numa fase inicial da sua participação cívica e social, que aqui têm as suas primeiras oportunidades para construir algo seu e em que acreditam.
Não tenho dúvidas que este caso de Oliveira do Hospital se repete em muitos outros concelhos portugueses. Por isso mesmo, a Igreja tem uma responsabilidade gigantesca na formação das crianças e jovens, e uma responsabilidade ainda maior em não frustrar a confiança que essas crianças e jovens, mas também as suas famílias depositam nela.
A Igreja falhou. E falhou gravemente. Os casos de assédio e abuso sexual de menores que ocorreram no seio das paróquias e que têm sido, felizmente, denunciados, foram antes disso ocultados e minimizados pela própria estrutura e hierarquia eclesiásticas. Se quem falha tem direito ao perdão, quem foi violentado tem direito ao apoio da instituição que, em muitos casos, chamava de casa. Mais do que isso tem direito a que seja feita justiça. O ocultamento de casos, amplamente documentado e não negado pelas autoridades ecuménicas, não só não permitiu a responsabilização dos criminosos como impediu que as vítimas pudessem seguir em frente após os danos incalculáveis causados por esta violência.
As declarações tardias, e esfarrapadas, de D. Manuel Clemente, demonstraram duas coisas – tudo continuaria igual se estas denúncias não viessem a lume, e há uma parte das autoridades eclesiásticas que continua absolutamente incapaz de comunicar de forma minimamente empática com os seus fiéis.
O Cardeal Patriarca, na hora de pedir desculpa, dirigiu “um pedido de perdão institucional e convicto a quem foi vitimado”, em palavras demasiado encaixotadas em burocratês numa situação que pedia sobretudo humanidade e compreensão. Por oposição, o Papa Francisco, em conversa com a CNN Portugal, foi incisivo e direto – “Quero ser muito claro em relação a isto: o abuso de homens e mulheres da Igreja – abuso de autoridade, abuso de poder e abuso sexual – é uma monstruosidade porque o homem ou mulher da igreja – quer seja padre, religioso ou religiosa ou laico ou laica – foi chamado a servir e a criar unidade, a contribuir para o crescimento, e o abuso destrói sempre”.
A Igreja que fala a língua dos que a vivem e que a mantêm viva é a Igreja que tem futuro. A que se amarra ao comunicado do costume, que não olha de igual para igual para os seus irmãos, que não é capaz de pôr mais sentimentos junto do supremo sentido que tem a fé, já partiu e ninguém a avisou. A que permite e é cúmplice da impunidade não representa e não merece as pessoas de bom coração.
Estas são palavras de quem se preocupa, de quem acredita no papel da Igreja Católica a ajudar tantos em todo o mundo. E que cresceu também com os ensinamentos e os sentimentos da fé cristã, de fraternidade e entreajuda, de simplicidade e partilha”.
Pedro Miguel Coelho
Jornalista do “Expresso”