Vitor Neves – Gestor
A demografia devia ser a prioridade das prioridades de cada responsável político, de Lisboa até Fornos de Algodres, do governo central até às autarquias. Toldados pela ilusão do poder, a grande maioria parece não conseguir ver que, por cada pessoa a menos, o “seu” poder é cada vez mais pequeno.
O Interior é cada vez menos país.
Estas coisas são para dizer assim, no osso: se o Interior tem cada vez menos pessoas é cada vez menos país. Um Portugal cada vez mais pequeno, consequência de um Interior cada vez mais despovoado e mais velho.
Os números dos Censos 2021 são implacáveis no desenho da realidade: o Interior em dez anos perdeu 8 ou mais pessoas por cada 100 pessoas. O distrito da Guarda, por exemplo, perdeu mais de 10 pessoas em cada 100. Há localidades que perderam mais de 20% da população residente desde 2011. Números muitos distantes da média nacional, que regista uma perda de cerca de 2%.
A estatística não anuncia melhoras para os anos seguintes: 20 concelhos, todos do interior, somam mais de um terço dos seus residentes com um nível etário acima dos 70 anos! E com as mais baixas taxas de natalidade. Portugal por cada 100 jovens têm agora 182 idosos, em 2011 eram 128. Se o panorama nacional não é animador, no Interior o cenário é dramático.
O Interior é cada vez MENOS. Menos pessoas, menos jovens, menos influência, menos investimento, menos futuro.
São demasiados Menos.
Os Censos 2021 são a evidência inequívoca que está a falhar (quase) tudo – as políticas de fixação e atração de pessoas; a gestão da imigração; os incentivos à natalidade. Nada consegue parar esta marcha inexorável para o nada. Sim, sem Pessoas resta o nada. E o nada é o fim. E até lá chegar, ao fim, o percurso anuncia-se cada vez mais penoso para quem fica, pela inocência do sonho, pela busca de uma vida diferente, pela falta de outra opção, de alternativa. Um destes dias, ficam apenas estes, os sem alternativa.
Se os dados aqui partilhados impressionam, não impressiona menos a resignação e o ignorar, pela inconveniência ou pela impotência, por parte da grande generalidade dos responsáveis políticos.
Um drama desta dimensão obriga a um sobressalto cívico…que não se vê, que não se escuta. Se não há solução, assuma-se, diga-se a verdade e que sejam implementadas medidas para mitigar o desconforto de quem ficou, de quem acreditou e de quem ama viver no Interior de Portugal.
(por favor, não considerar as tretas de quem diz que em Portugal não há Interior, que é tudo perto, blá, blá, blá! Se for mais facilitador, que não se chame Interior e se chame outra coisa qualquer. Basta olhar para o mapa demográfico do país, para se perceber que existe uma região que vai desde Trás-os-Montes, passa pelas Beiras e chega ao Alentejo, que sofre de um despovoamento e envelhecimento galopantes, não comparável com o que se passa no resto do nosso retângulo…)
A demografia é o grande desafio do Interior nestes tempos incertos e nada meigos.
A demografia devia ser a prioridade das prioridades de cada responsável político, de Lisboa até Fornos de Algodres, do governo central até às autarquias. Toldados pela ilusão do poder, a grande maioria parece não conseguir ver que, por cada pessoa a menos, o “seu” poder é cada vez mais pequeno.
Este texto é quase igual a outros que já escrevi nesta caderneta da demografia, é como um cromo repetido – na tristeza do “já tenho” reside a esperança “na troca”, para conseguir o que nos falta.
No Interior, a primeira coisa que falta é encarar esta realidade de frente, olhos nos olhos, sem discursos vazios de ação e/ou resignações fatalistas.
Ainda Há Pessoas.