Depois do incêndio de 2017 ter deixado a queijaria reduzida a escombros.
Pensou em abandonar tudo, a seguir aos incêndios de outubro de 2017, e refazer a vida noutras paragens, mas o coração falou mais alto que a razão, e decidiu ficar para não deixar morrer uma tradição familiar na produção do tão apreciado queijo Serra da Estrela.
Paula Lameiras tinha tudo para desistir. A seguir ao grande incêndio de 2017, ficou sem queijaria, sem casa e todo um manancial de objetos e artefactos utilizados na produção do queijo Serra da Estrela, pelas várias gerações de pastores e queijeiras da família, em Vila Franca da Beira.
A juntar ao desespero de ter perdido uma vida de “muito trabalho”, aliava-se a “chamada” de um dos irmãos a viver no Luxemburgo, para tentar uma nova vida lá fora, sem as dificuldades que esta acarreta.
Mas o coração falou mais alto, e apesar de todos os obstáculos e contratempos para se voltar a erguer das cinzas, Paula Lameiras e o marido decidiram ficar e não deixar acabar uma tradição secular na família de ambos, ligada à produção do genuíno queijo Serra da Estrela. “Fizemo-lo a pensar no meu sogro (o pastor António Lameiras), se nós fossemos embora e abandonássemos isto (as ovelhas), ele morria mais depressa”, conta a conhecida queijeira de Vila Franca da Beira, e uma das grandes resistentes ao fogo de outubro de 2017. “Nós tínhamos noção que essa decisão era acabar mais rápido com ele (sogro) e ficámos”, conta, sem esconder a mágoa em que vive, desde que o fatídico dia 15 de outubro.
“Eu perdi quase tudo, fiquei sem uma peça de roupa para vestir, e agora para algumas pessoas passei de vítima a beneficiária, estamos todos ricos, é muito triste”, diz, desiludida com certas “invejas” e tentativas de “vingança” de que tem sido alvo, localmente. “Eu estive um ano sem produzir queijo, nem requeijão, só retomei a 22 de novembro passado, mas para alguns ainda sou muito ajudada”, refere, “revoltada” com tanta “maldade”, em torno do processo de reconstrução da sua queijaria e da própria habitação, que fez com apoios públicos do Ministério da Agricultura e da CCDRC.
“Nós tivemos mais de 400 mil euros de prejuízos e só conseguimos ver aprovados 200 mil, o resto tivemos nós de comprar, e há muito ainda por fazer, mas para muitos a mim deram-me tudo”, lamenta Paula Lameiras, não deixando também de criticar o facto dos apoios do Estado só terem chegado contra apresentação do pagamento das faturas, “como se se tratasse de uma apoio normal, mas isto não foi um fogo normal”, lembra. “Nós ficámos sem nada, não tínhamos dinheiro para nada, a nossa sorte foi termos particulares a emprestarem-nos dinheiro, senão não conseguíamos”. A queijeira garante que “agora é que as dificuldades se estão a fazer sentir”, mas ainda assim não desiste da produção do afamado queijo Serra da Estrela, cuja tradição teima em resistir na família Lameiras. “Deixar esta vida, era matar o meu sogro e uma parte da história dos Lameiras”, reconhece, tentando, agora, renascer aos poucos.