O realizador Tiago Cerveira, de Oliveira do Hospital, estreia a 14 de outubro o documentário “Pagar a promessa”, no qual aborda a tradição que um pastor da Serra da Estrela e a família teimam em manter, mesmo depois do fogo.
Um dia antes de se assinalar um ano dos grandes incêndios de 15 de outubro, que devastaram a região de pastoreio das ovelhas da Serra da Estrela e provocaram a morte de muitos animais, o realizador Tiago Cerveira estreia o documentário “Pagar a Promessa”, um filme que retrata uma tradição antiga dos pastores da região, que no Domingo de Pascoela (após o Domingo de Páscoa) levam as ovelhas até São Geraldo, no concelho de Tábua.
O filme procura registar a tradição que uma família da aldeia de Vendas de Gavinhos, em Oliveira do Hospital, faz questão de manter, levando o seu melhor gado, enfeitado com borlas (uma espécie de pompons com cores aguerridas) e loiça (chocalhos e campainhas) até São Geraldo, num percurso de 20 quilómetros para pagar a promessa ao santo que dá nome ao lugar, disse à agência Lusa Tiago Cerveira.
A família que o realizador retrata mantém a tradição “há seguramente quarenta anos”, pagando não apenas a promessa ao santo, mas ao avô, também pastor, que já muito doente tinha pedido ao filho para ir com as ovelhas até São Geraldo, “nem que fosse a última coisa que fizesse”.
Na família Alves, apenas Sebastião se dedica a tempo inteiro à pastorícia, mas, aquando da romaria, toda a família acaba por se juntar e parte dela faz os 20 quilómetros até São Geraldo, explicou Tiago Cerveira, referindo que esta romaria acontece um pouco por toda a região da Serra da Estrela, envolvendo outras localidades e capelas.
Para o documentário, o jovem realizador retratou a preparação (que começa na madrugada do dia anterior) e a romaria, procurando registar uma tradição que vai caindo em desuso.
“O Sebastião tem 40 anos, mas não sabe se a próxima geração se mantém. Não acredita nisso”, sublinhou Tiago Cerveira, realizador que foi um dos criadores da série documental “15 Memórias do Fogo”.
Apesar de o documentário não falar diretamente sobre os fogos de outubro, o incêndio acaba por estar presente, com a negritude da paisagem a contrastar com as borlas de cores aguerridas das ovelhas.
“Há aqui um contraste entre o negro do cenário do 15 de outubro e as cores aguerridas da festa do gado, que simboliza a vida, a abundância. Aquela imagem é marcante, no meio de um cenário negro, há um rebanho a desfilar, com o som dos chocalhos, com cor e com pastores cheios de orgulho”, frisou.
O próprio Sebastião Alves, o pastor a tempo inteiro da família que é retratada no documentário, “perdeu dezenas de cabeças e o ovil” no fogo, diz.
“Mas, apesar de ter sido lesado, foi à mesma à festa de São Geraldo”, frisou Tiago Cerveira, notando que este ano houve muito menos pastores a subir até à pequena aldeia de Tábua, devido ao fogo.
O incêndio, diz, “levou muitos animais e também vontade de rumar. Alguns perderam a alegria, outros perderam a totalidade do rebanho ou uma grande quantidade de ovelhas”, conta.
O documentário estreia-se a 14 de outubro, no Convívio de Pastores da Serra da Estrela, em São Geraldo, um evento que também foi realizado o ano passado, dessa feita no próprio dia do fogo, quando muitos perderam grande parte do seu sustento.
Depois da estreia, o realizador pretende levar o filme a festivais de cinema, para além de querer fazer uma apresentação da película em Tábua e em Oliveira do Hospital.